domingo, 29 de novembro de 2009

O Código de Procedimentos Processuais do Estado de São Paulo foi protocolado nesta quinta-feira (26/11)

PROJETO DE LEI Nº , DE 2009

Institui o Código de Procedimentos




Procedimentos em Matéria

Processual no âmbito do Estado de São Paulo e

dá outras providências correlatas.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:

CAPÍTULO I

DOS PRINCÍPIOS GERAIS

Artigo 1º - Os procedimentos em matéria processual, no âmbito do Estado de São

Paulo, passam a vigorar em conformidade com princípios e normas desta lei.

Artigo 2º - São princípios dos procedimentos em matéria processual:

I - a celeridade na prestação jurisdicional;

II - a economia e a eficiência processuais;

III - a simplificação e instrumentalidade das formas;

IV - a conciliação;

V – a moralidade administrativa;

VI - a cooperação entre as partes, advogados privados e públicos, defensores públicos,

membros da Advocacia privada e pública, da Defensoria Pública, do Ministério Público, da

Magistratura, funcionários do Poder Judiciário e demais participantes do processo.

§ 1º - Quando a tramitação do processo não se adequar às especificidades objetivas e

subjetivas da causa, deve o juiz, preservado o devido processo constitucional, determinar a

prática de atos que melhor se ajustem ao fim do processo, procedendo às necessárias adaptações

procedimentais.

§ 2º - A cooperação dos sujeitos referidos no inciso VI dar-se-á sem prejuízo dos

deveres processuais de probidade e boa-fé e será concretizada pela efetiva participação na

realização e no cumprimento dos atos e termos processuais.

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Artigo 3º - Para a efetiva concretização dos princípios desta lei será obrigatória a

participação dos servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública,

em cursos de capacitação e reciclagem profissionais, a cada período de 03 (três) anos, com o

objetivo, dentre outros, de atualizar os conhecimentos e melhorar o atendimento ao público.

Parágrafo único - Compete ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria

Pública a regulamentação dos cursos previstos no “caput”.

Artigo 4º - Para consecução desta lei, dar-se-á preferência aos meios eletrônicos para a

transmissão, recebimento, devolução e arquivamento de informações, atos e outros dados

judiciais.

Artigo 5º - A conciliação e a mediação buscarão a solução pacífica total ou parcial do

conflito em qualquer fase do processo e grau de jurisdição.

CAPÍTULO II

DOS PROCEDIMENTOS EM MATÉRIA PROCESSUAL

Artigo 6º - Para fins desta lei, todos os serviços, atos e termos realizados no Poder

Judiciário, pelos magistrados e seus serventuários, pelas partes e seus procuradores, são

considerados procedimentos em material processual.

Artigo 7º - Para serviço, ato ou termo não disciplinado por esta lei, observar-se-ão o que

a respeito deles disponham as normas gerais de procedimento previstas no Código de Processo

Civil, no Código de Processo Penal e nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral do Tribunal

de Justiça.

CAPÍTULO III

DO SISTEMA DE DOCUMENTOS, DISTRIBUIÇÃO E DE PROTOCOLOS PROCESSUAIS

POR MEIO DIGITAL

Artigo 8º - Fica instituído, no âmbito do Estado de São Paulo, o “Sistema de

Documentos, Distribuição e Protocolo Processuais por Meio Digital”.

§ 1º - Para os fins deste artigo, constituem documentos processuais eletrônicos os

mandados, ofícios, alvarás, guias e outros documentos que a lei processual assim determinar,

disponibilizados na página do Tribunal de Justiça na rede mundial de computadores, para a

prática de atos processuais.

§ 2º - Para os fins desta lei, constitui-se protocolo processual eletrônico o meio

disponível na página do Tribunal de Justiça na rede mundial de computadores que possibilita a

prática e o envio de petições, recursos e outros atos e documentos processuais.

§ 3º - Para os fins desta lei, constitui-se distribuição eletrônica a rotina de précadastramento

de petição inicial a ser utilizada exclusivamente por advogados com inscrição

regular na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, cujo serviço estará disponível dentro do

sítio do Tribunal de Justiça do Estado, destinando-se exclusivamente a petições iniciais a serem

encaminhadas ao Distribuidor Cível da Capital ou aos Distribuidores Cíveis dos Fóruns do

Interior, vedadas petições de qualquer outra natureza.

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§ 4º - Compete ao Tribunal de Justiça disponibilizar, em meio eletrônico e no formato

adequado, o Sistema de Documentos e de Protocolos Processuais Eletrônicos.

Artigo 9º - O envio de petições, recursos e outros atos e documentos processuais gerará

recibo comprobatório da transmissão e da recepção dos dados e atenderá as seguintes

condições:

I – não se admitirá o fracionamento de petição, recurso, ato ou documentos que

acompanham o respectivo ato processual;

II – o acesso ao sistema eletrônico dependerá da utilização, pelo usuário, da sua

assinatura digital a ser obtida perante qualquer autoridade certificadora credenciada pela ICPBrasil,

e o seu prévio cadastramento no Cadastro de Informações Judiciárias;

III – observar o horário de funcionamento das unidades judiciárias responsáveis pela

recepção dos atos e documentos processuais transmitidos pelo Sistema de Documentos e de

Protocolos Processuais Eletrônicos.

Artigo 10 – As petições, recursos, atos ou documentos que acompanham o respectivo

ato processual, transmitidos fora dos horários de atendimento ao público, serão considerados

como recebidos no expediente subsequente.

Artigo 11 – A não obtenção pelo usuário de acesso ao Sistema, bem como eventuais

defeitos de transmissão e recepção de dados, não servirão de escusa para o descumprimento dos

prazos legais, exceto quando reconhecido o fato por Provimento do Tribunal de Justiça.

Artigo 12 – Constarão do recibo comprobatório da transmissão e da recepção dos dados

as seguintes informações:

I – o número do protocolo gerado pelo Sistema;

II – o número do processo e os nomes das partes e de seus procuradores;

III – a data e o horário do recebimento.

Artigo 13 – É dever das partes, ou de seus procuradores, o preenchimento e

encaminhamento correto dos documentos processuais previstos nesta lei, competindo ao Juiz,

ou ao servidor do Ofício ou Seção especialmente designado, a apreciação do seu cumprimento.

Parágrafo único – São da exclusiva responsabilidade dos usuários:

a) o sigilo da assinatura digital, não sendo oponível, em qualquer hipótese, alegação do

seu uso indevido;

b) a equivalência entre os dados enviados e os constantes do documento remetido;

c)as condições das linhas de comunicação e acesso ao seu provedor da rede mundial de

computadores;

d) a edição da petição em conformidade com as restrições impostas pelo serviço, ao que

se refere à formatação e tamanho do arquivo digital enviado;

e) o acompanhamento da divulgação dos períodos em que o serviço eletrônico não

estiver disponível em decorrência de manutenção técnica ou problemas nas linhas de

comunicação do seu provedor.

Artigo 14 – O pré-cadastramento previsto no parágrafo 3º do artigo 8º será válido pelo

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prazo de cinco dias corridos, durante os quais o advogado deverá protocolizar a petição inicial

no Setor de Distribuição da Capital ou dos demais Fóruns do Estado, contando-se este prazo na

forma do artigo 184 do Código de Processo Civil.

§ 1º - Após o transcurso do prazo previsto no “caput”, o pré-cadastramento será excluído

do Sistema, ficando vedado o recebimento da peça pela Distribuição.

§ 2º - O pré-cadastramento não interrompe a prescrição, o que somente ocorrerá quando

da distribuição da inicial, nos termos do artigo 219 do Código de Processo Civil.

Artigo 15 – O advogado deverá se dirigir ao Setor de Distribuição da Capital ou dos

demais Fóruns do Estado com a petição inicial e os documentos que a instruem capeada pela

folha de pré-cadastramento gerada pelo Sistema, com a finalidade de protocolizar a referida

peça processual.

Artigo 16 – Os dados constantes do pré-cadastramento são de inteira responsabilidade

do advogado que o fizer e só serão alterados mediante requerimento a ser formulado perante o

Juízo ao qual a petição inicial for distribuída, sendo vedado ao operador da distribuição

manipular ou alterar quaisquer destes dados nessa rotina.

Parágrafo único – O lançamento dos dados no Sistema não dispensa a instrução das

petições iniciais, na forma do artigo 283 do Código de Processo Civil.

Artigo 17 – O serventuário lotado no Setor de Distribuição da Capital ou dos demais

Fóruns do Estado que receber a petição inicial pré-cadastrada terá somente que registrar o

número de protocolo extraído do Sistema, por digitação ou leitura ótica, verificar a sua validade,

bem como a prova do recolhimento das custas e da taxa judiciária, salvo quando houver pedido

de gratuidade de justiça, diferimento do recolhimento e nas demandas destinadas aos Juizados

Especiais Cíveis.

Artigo 18 – Não será recebida a petição inicial pré-cadastrada dirigida a Comarca

diversa onde a mesma está sendo apresentada e quando não se encontrar demonstrado o

recolhimento das custas e da taxa judiciária correspondentes, salvo os casos de gratuidade de

justiça, diferimento do recolhimento e nas demandas destinadas aos Juizados Especiais Cíveis.

Artigo 19 – O Tribunal de Justiça promoverá a migração dos atuais dados impressos

para o Sistema de Documentos, Distribuição e Protocolos Processuais Eletrônicos, no prazo de

12 meses a contar da entrada em vigor desta lei, podendo a Presidência firmar convênio com o

estabelecimento bancário depositário dos depósitos judiciais ou promover licitação para

implementação dos sistemas.

Artigo 20 - No processo eletrônico dever-se-á assegurar o acesso preferencial, por

técnicas disponíveis, dos partícipes do processo e de seus procuradores, bem como dos

auxiliares, sem prejuízo da acessibilidade ao conteúdo integral dos autos por quaisquer pessoas,

salvo nos casos previstos no inciso IX do art. 93 da Constituição Federal.

Artigo 21 - Compete ao Tribunal de Justiça, observada a legislação aplicável,

disponibilizar e regulamentar os meios para efetiva implantação do Sistema de Documentos,

Distribuição e Protocolos Eletrônicos, no prazo de 120 dias, contados da vigência da presente

lei.

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CAPÍTULO IV

DA PRÁTICA DOS ATOS PROCESSUAIS EM GERAL

Seção I

Das petições

Artigo 22 - As petições iniciais serão distribuídas e autuadas pelo Ofício respectivo no

prazo de 48 horas, mesmo prazo em que devem ser autuadas as petições em geral.

Parágrafo único - As petições urgentes e de tutelas emergenciais serão distribuídas

incontinenti e remetidas à Secretaria da Vara competente, que fará a imediata conclusão dos

autos, para deliberação do Juiz.

Artigo 23 - As petições iniciais serão protocoladas com numeração, na parte superior

direita, a partir do número 2, observado que cada documento juntado deverá corresponder a um

número separadamente.

Parágrafo único - Ao recepcionar o documento a Secretaria certificará nos autos a

correção da numeração efetuada pela parte, realizando as necessárias retificações.

Artigo 24 - Todas as petições, ofícios, documentos e papéis em geral, endereçados aos

órgãos do Poder Judiciário do Estado de São Paulo, conterão dois furos na lateral esquerda e

serão confeccionados em tamanho capaz de facilitar a rápida juntada aos autos.

Parágrafo único: O Tribunal de Justiça definirá os padrões definidos no “caput”.

Artigo 25 - Nos casos de urgência, o procedimento previsto em lei pode ser,

motivamente, adaptado às necessidades concretas tanto para o reconhecimento do direito

aplicável à espécie quanto para a sua efetivação.

§ 1º - Os pedidos de concessão de tutela de urgência, após o proferimento da sentença,

poderão ser formulados diretamente ao Tribunal competente mediante petição

instrumentalizada, assegurado prévia ou posteriormente, conforme o caso, o contraditório.

§ 2º - Os autos da petição referida no parágrafo anterior serão apensados aos do processo

principal com sua chegada ao Tribunal.

Seção II

Das Ordens, Requisições e Ofícios

Artigo 26 - As ordens, requisições e ofícios expedidos pelo Juiz serão,

preferencialmente, encaminhados por meios eletrônicos aos destinatários.

§ 1º - Não sendo possível o encaminhamento do documento na forma prevista no

“caput”, o interessado poderá confeccionar referido documento e apresentá-lo em juízo, por

petição escrita, para conferência e encaminhamento.

§ 2º - O Tribunal de Justiça deverá alocar em seus sítios modelos aptos a serem

utilizados pelas partes para os fins do parágrafo anterior.

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Seção III

Dos Mandados

Artigo 27 - Os mandados serão cumpridos por meio eletrônico, observando-se o

disposto na legislação específica, e, quando não for possível, o serão pela via postal ou por

Oficial de Justiça.

§ 1º - O Juiz sempre fixará prazo para o cumprimento, observado o máximo de 30

(trinta) dias.

§ 2º - O não cumprimento da determinação no prazo fixado pelo Juiz, sem razoável

justificativa, constituirá falta disciplinar que será lançada no prontuário do servidor, com suas

consequências, garantindo-se a este, previamente, ampla defesa em processo administrativo.

§ 3º - O Juiz poderá determinar a prática de atos e diligências diretamente nas Comarcas

contíguas, de fácil acesso e pertencentes a uma mesma região metropolitana, conforme

orientação do Tribunal de Justiça.

Artigo 28 - Nos termos das normas da Corregedoria Geral de Justiça, poderão os juízos

adotar modelos de decisões-mandados para a prática e cumprimento dos atos processuais.

Parágrafo único - Para os fins do “caput”, considera-se decisões-mandados aquelas em

que o próprio suporte material da decisão serve de mandado para seu cumprimento.

Seção IV

Dos Editais

Artigo 29 - Os editais de citação, intimação, praça, leilão e outras comunicações

processuais poderão ser elaborados pelo interessado, que enviará as respectivas minutas ao

Ofício respectivo por meio eletrônico ou pela entrega de arquivo digital, cabendo ao escrivãodiretor

a revisão antes da apresentação ao juiz competente.

§ 1º - O Tribunal de Justiça deverá alocar em seus sítios modelos aptos a serem

utilizados pelas partes para os fins do “caput”.

§ 2º - Observados os requisitos de autenticidade e padronização, as certidões cartoriais

também poderão ser apresentadas pelos interessados nos termos do “caput”.

§ 3º - Salvo disposição expressa em contrário, os Editais poderão ser publicados

exclusivamente em local especificamente criado para tal fim no sítio do Tribunal de Justiça,

atendendo aos requisitos de ampla publicidade, autenticidade e segurança, com observância das

regras estabelecidas na legislação sobre certificação digital.

Seção V

Das Hastas Públicas

Artigo 30 - As hastas públicas serão, preferencialmente, realizadas de forma eletrônica.

§ 1º - Na impossibilidade de cumprimento do “caput”, as hastas públicas serão

realizadas no átrio do fórum pelo Oficial de Justiça de plantão ou designado pelo Juiz.

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§ 2º - Mediante requerimento da parte interessada e autorização do Juiz, poderão ser

realizadas em local diverso, público ou privado, por empresas e profissionais especializados

previamente cadastrados nas Secretarias das Varas e constantes de cadastro público geral que

será mantido pelo Tribunal de Justiça.

Seção VI

Dos Depósitos de Valores e dos

Mandados de Levantamento

Artigo 31 - Excetuando-se os depósitos destinados a despesas de condução de Oficial de

Justiça, deverão incidir juros e correção monetária sobre os depósitos judiciais realizados em

nome dos interessados e à disposição do juízo na instituição financeira indicada pelo Juiz ou

Tribunal.

§ 1º - As contas poderão receber depósitos em continuação, quando houver identidade de

destinação das importâncias recolhidas.

§ 2º - As moedas estrangeiras, pedras e metais preciosos serão depositados na mesma

instituição financeira, isentas de custas e emolumentos.

§ 3º - Os depósitos poderão ser realizados em outros estabelecimentos de crédito, com a

utilização da transação denominada “Transferência Eletrônica Disponível” (TED).

§ 4º - Os depósitos de verbas devidas aos Oficiais de Justiça, após decorridos 03 (três)

meses da data de suas realizações, serão acrescidos de juros e correção e, decorrido o lapso

temporal de 10 anos, não sendo utilizados e nem reclamados pela parte interessada, serão

transferidos para uma conta à disposição do Tribunal de Justiça, sob a rubrica de receita

extraordinária.

Artigo 32 - Qualquer levantamento em conta judicial será feito mediante utilização de

Mandado de Levantamento Judicial – MLJ, que poderá ser expedido por meio eletrônico, e cuja

mensagem será enviada diretamente à agência da instituição financeira depositária, contendo o

valor a ser levantado, com os acréscimos devidos, a identificação da parte ou do procurador

com poderes para promover o levantamento.

§ 1º - Os Mandados de Levantamento Judicial expedidos para levantamentos em contas

judiciais deverão conter a assinatura física ou eletrônica do Escrivão-diretor e do Juiz.

§ 2º - Os juízes e escrivães-diretores em exercício terão seus padrões de firmas e/ou

assinaturas digitais certificadas, para identificação nas agências ou postos dos estabelecimentos

bancários localizados nos respectivos fóruns, ou onde se efetivarem os depósitos.

§ 3º - A pedido do interessado, o levantamento poderá se efetivar por meio de

transferência eletrônica disponível (TED) para conta de sua própria titularidade ou de seu

advogado.

Seção VII

Das Expedições das Certidões

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Artigo 33 - As certidões serão expedidas pelos Ofícios Judiciais no prazo de 03 (três)

dias úteis, mediante requerimento do interessado e pagamento das taxas e emolumentos fixados

pelo Tribunal de Justiça.

Parágrafo único - O prazo previsto no “caput” poderá ser modificado motivadamente

pelo juiz, para mais ou para menos, a depender das circunstâncias concretas do caso.

Seção VIII

Das Cargas de autos

Artigo 34 - A carga de autos de processo para vista fora do Ofício não poderá ser negada

aos procuradores das partes. Sendo comum às partes o prazo, só em conjunto ou mediante

prévio ajuste por petição nos autos, poderão os seus procuradores retirar os autos, ressalvada a

obtenção de cópias para a qual cada procurador poderá retirá-los pelo prazo de 1 (uma) hora

independentemente de ajuste.

§ 1º - Quando não estiver em curso prazo comum, a carga poderá ser feita por até 05

(cinco) dias, independentemente de autorização do Juiz.

§ 2º. Para prazos maiores que o referido no parágrafo anterior ou não sendo parte no

processo, o interessado deverá obter autorização do Juiz ou Tribunal de Justiça.

§ 3º - O Servidor do Ofício ou Seção não poderá negar à parte ou ao seu procurador a

carga rápida dos autos, no prazo previsto no “caput”, para breves exames ou extração de cópias

fora do Ofício.

§ 4º - O controle da carga rápida será feito por meio eletrônico ou físico simplificado e

seu registro será eliminado contra a devolução dos autos, sob a vista daquele que fizer a carga

ou de quem o esteja substituindo.

Seção IX

Das Cartas Precatórias, Rogatórias e de Ordem

Artigo 35 - As Cartas Precatórias, Rogatórias e de Ordem são dispensadas de autuação,

servindo os encartes remetidos pelo juízo deprecante como face das mesmas. Nos encartes

deverão ser inseridos: o Ofício deprecado, a etiqueta adesiva remetida pelo Ofício do

Distribuidor, o nome das partes, a natureza do feito e, no alto à direita, o número do processo.

§ 1º - Os Juízes, quando possível, servir-se-ão das cartas como mandado.

§ 2º - Constatado que o ato pode ser cumprido em endereço de jurisdição diversa da

informada na carta precatória ou que o endereço originário pertence a outra jurisdição, o Juízo

deprecado determinará ao Escrivão diretor do Ofício o encaminhamento ao juízo competente,

comunicando o Juízo deprecante.

§ 3º - Os procuradores das partes poderão, mediante autorização do Juiz, retirar as cartas

para as providências cabíveis junto ao Juízo deprecado, devolvendo-as, depois de cumpridas, ao

Juízo deprecante.

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§ 4º – Após a implantação do Sistema de Documentos, Distribuição e Protocolo

Eletrônico, o Tribunal de Justiça aplicará o mesmo sistema para implantação da Carta

Precatória Digital, entre todos os juízos de Direito do Estado de São Paulo, mediante assinatura

eletrônica do juízo Deprecante e devolução eletrônica da mesma forma, pelo Juízo Deprecado.

§ 5º – Cabe ao Tribunal de Justiça providenciar o cadastramento da assinatura eletrônica

dos juízes de Direito para os fins dessa lei, utilizando o mesmo sistema de certificação digital

do Sistema de Documentos, Distribuição e Protocolo Eletrônico, no prazo de 12 meses a partir

de sua implementação.

Seção X

Dos atos ordinatórios

Artigo 36 - O Cartório do Ofício Judicial praticará, independentemente de determinação

do juiz, os atos ordinatórios relativos à oitiva das partes e dos terceiros ao longo do processo,

assim entendidos, dentre outros, abertura de vistas para réplica, para manifestar-se em exceções,

impugnação ao valor da causa, intervenção de assistente, juntada de documentos e contrarrazões

de recurso.

§ 1º - Poderá o juízo, por portaria, indicar quais atos ordinatórios podem ser praticados,

observando-se o “caput”.

§ 2º - Igual competência cabe à Corregedoria Geral de Justiça.

Seção XI

Da comunicação dos atos

Artigo 37 - As intimações das partes pela imprensa oficial deverão conter informações

mínimas suficientes a permitir a compreensão do conteúdo das decisões e dos despachos

independentemente de exame dos próprios autos.

§ 1º - As intimações pela imprensa das sentenças e acórdãos conterão, além do número

do processo, Vara ou Câmara julgadora, o nome do Juiz ou do Desembargador relator, a íntegra

da parte dispositiva e o tópico final.

§ 2º - As intimações das decisões interlocutórias, além das identificações acima

mencionadas, conterão um resumo mínimo que permita ao interessado compreender o conteúdo

independentemente de exame dos autos.

§ 3º - Os representantes judiciais das pessoas jurídicas de direito público serão intimados

pessoalmente.

§ 4º - Da publicação das decisões proferidas pela Justiça comum e pelos Juizados

Especiais constará o valor do preparo do recurso respectivo, bem como do porte de remessa e

retorno.

§ 5º - A publicação a que se refere o parágrafo anterior indicará os meios de

recolhimento dos valores devidos, indicando as guias e os códigos a serem empregados para tal

fim.

§ 6º - A insuficiência no valor do preparo implicará deserção, se o recorrente, intimado,

não vier a complementá-lo no prazo de cinco dias.

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Artigo 38 - No caso de processos em que figurem como rés as pessoas jurídicas de

direito público, instituições financeiras e prestadoras de serviço público, as notificações iniciais

e as citações dos processos em curso em todas as unidades judiciárias do Estado realizar-se-ão

preferencialmente por meio eletrônico.

§ 1º - Sem prejuízo das publicações realizadas no Diário Oficial, as intimações pessoais

também poderão ser realizadas na pessoa dos procuradores previamente cadastrados.

§ 2º - O Tribunal de Justiça disciplinará a forma de cadastramento, recepção e

confirmação da citação e intimação efetuadas conforme o “caput” e o parágrafo anterior.

§ 3º - Demais interessados poderão requerer perante o Tribunal de Justiça cadastramento

para os fins preconizados no “caput”.

Artigo 39 - As intimações de terceiros, pessoas físicas ou jurídicas de direito privado,

para prestação de informações e prática de atos processuais, inclusive de testemunhas, poderão

ser realizadas extrajudicialmente via Cartório, observando-se a necessidade de juntada aos autos

do comprovante de recepção pessoal do ato ou da declaração de realização do ato com

resistência ou impossibilidade de assinatura, com descrição da situação e da pessoa

comunicada, para incidência de sanções de ordem material ou processual, as quais deverão

constar expressamente da intimação, conforme modelo a ser fornecido pela Corregedoria Geral

de Justiça às serventias.

Artigo 40 – Ressalvadas as disposições previstas no Código de Processo Civil e em

circunstâncias excepcionais, poderá o magistrado autorizar que sejam efetuadas intimações por

via telefônica, lavrando-se certidão da ocorrência nos autos, com indicativo do horário em que

efetuada a ligação, duração, nome dos interlocutores e demais dados que possam identificar a

real ocorrência da comunicação e o alcance da finalidade do ato.

CAPÍTULO V

DOS PRAZOS

Artigo 41 - Nenhum processo ficará paralisado em cartório, por mais de 60 (sessenta)

dias, aguardando providências das partes, de seus procuradores ou do Ministério Público,

ressalvados os casos de suspensão ou de prazo maior que tenha sido fixado pelo Juiz ou

convencionado pelas partes.

Parágrafo único. Decorrido o prazo, o escrivão-diretor assim certificará, fazendo a

imediata conclusão dos autos.

CAPÍTULO VI

DAS PROVAS

Artigo 42 - O juiz, durante as providências preliminares, determinará, quando o caso não

comportar julgamento antecipado da lide, que as partes indiquem os pontos controvertidos e as

respectivas provas que pretendem produzir, justificando-as.

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Parágrafo único. Caso a parte sustente que determinado fato esteja provado e o juiz

entenda relevante maior dilação probatória, caberá a este indicar o que deverá ser objeto de

instrução probatória apontando a quem cabe o respectivo ônus da prova.

Artigo 43 - O juiz, ao nomear perito, especificará a respectiva especialidade e, quando

existente, o número de registro no órgão competente, sob pena de ineficácia da nomeação.

§ 1º - A mesma exigência deve ser observada pela partes ao indicarem seus assistentes

técnicos.

§ 2º - Os cartórios judiciais deverão manter currículo atualizado anualmente dos peritos

nomeados.

§ 3º - As partes deverão anexar sumário do currículo profissional quando da indicação

dos assistentes.

Artigo 44 - Os peritos deverão ser escolhidos entre os profissionais habilitados pelo

Tribunal de Justiça, sendo vedada, salvo decisão fundamentada, a nomeação de outros

profissionais.

§ 1º - Os profissionais habilitados deverão apresentar anualmente ao Tribunal de Justiça

certidão expedida pelo respectivo Conselho Regional ou órgão equivalente, comprovando que

se encontra plenamente habilitado para exercício da profissão e que não sofreu nenhuma

punição administrativa, sob pena de exclusão do quadro de peritos do Tribunal de Justiça do

Estado de São Paulo.

§ 2º - O Tribunal de Justiça elaborará, no prazo de 12 meses a contar da data da

publicação desta lei, lista de peritos, classificados por especialização e região de atuação,

utilizando critérios de currículo, títulos e experiência profissional.

§ 3º - A relação de peritos habilitados deverá ser publicada anualmente no Diário Oficial

do Estado e disponibilizadas ao público em geral no sítio do Tribunal de Justiça.

CAPÍTULO VII

DO PROTOCOLO INTEGRADO

Artigo 45 - O Protocolo Integrado permite que quaisquer petições ou recursos destinados

a processos em trâmite na Justiça Estadual sejam protocolizados, na forma física, em qualquer

foro ou no Tribunal de Justiça, valendo a data da protocolização para a contagem dos prazos

legais.

§ 1º - As petições devem conter a indicação da unidade judiciária, número do processo e

poderão estar acompanhadas de documentos.

§ 2º - Quando apresentadas no Protocolo Integrado, as petições que apresentem ou

substituam testemunhas, requeiram o depoimento pessoal das partes, requeiram a prestação de

esclarecimentos de perito e/ou assistentes técnicos ou que sejam dirigidas a processos em que

há réu preso terão prioridade de envio à Comarca de origem.

§ 3º - A utilização do Protocolo integrado não depende do recolhimento de quaisquer

custas ou emolumentos adicionais.

§ 4º - Os recursos deverão estar acompanhados dos comprovantes de recolhimento das

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custas de preparo e do porte de remessa e retorno, quando exigíveis.

§ 5º - No caso de parte beneficiária da assistência judiciária é permitido o protocolo do

Recurso Especial e do Recurso Extraordinário no Protocolo Integrado.

CAPITULO VIII

DOS JUÍZES LEIGOS E DOS CONCILIADORES

NOS JUIZADOS ESPECIAIS

Artigo 46 - Ao Juiz-Diretor do Juizado Informal de Conciliação - JIC ou do Juizado

Especial caberá a escolha de juízes leigos e conciliadores.

§ 1º - Poderão atuar como juízes leigos e conciliadores, voluntários e não remunerados,

magistrados, membros do Ministério Público, procuradores do Estado e dos Municípios,

defensores públicos, todos aposentados, advogados, psicólogos, assistentes sociais e outros

profissionais selecionados, todos com experiência, reputação ilibada e vocação para a

conciliação.

§ 2º - A indicação dos advogados para os fins do parágrafo anterior será feita pela

Subseção local da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, que elaborará relação anual

específica a ser disponibilizada ao Juízo competente.

§ 3º - Quando solicitada, será fornecida certidão do efetivo exercício, com menção à

data do seu início e término.

§ 4º - Os juízes leigos e os conciliadores assinarão o termo de compromisso em livro

próprio, antes de assumir as funções.

§ 5º - Os juízes leigos e os conciliadores assinarão o Livro de Presença nos dias em que

comparecerem as sessões.

Artigo 47 - Fica autorizada a criação e instalação, nas unidades judiciárias da Capital e

do Interior do Estado, do Setor de Conciliação e Mediação para as questões cíveis que versarem

sobre direitos patrimoniais disponíveis, questões de família e da infância e juventude.

Parágrafo único - O Tribunal de Justiça disciplinará a forma de funcionamento dos

referidos setores.

CAPITULO IX

DA PAUTA DAS AUDIÊNCIAS

Artigo 48 - As audiências de conciliação e de instrução e julgamento serão designadas,

preferencialmente, para o período vespertino.

Artigo 49 - Em caso de atraso superior a uma hora do horário designado para a

audiência, poderão quaisquer das partes e/ou seus procuradores, após simples comunicação

verbal ao Oficial de Justiça de plantão ou ao escrevente de sala, retirar-se, independentemente

de autorização do Juiz, que neste caso se presumirá, dando-se a audiência por prejudicada,

considerando-a redesignada para o primeiro dia e horário desimpedido da pauta, consoante

indicação do cartório ou ofício competente.

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Parágrafo único - A pedido da parte ou seus procuradores, o Oficial de Justiça de

plantão ou o Diretor ou Oficial Maior da Secretaria respectiva emitirá imediatamente certidão

dando conta da ocorrência do atraso superior a uma hora, fato que também deverá ser

certificado nos autos.

Artigo 50 - Quando a parte for pessoa jurídica, ela poderá ser representada por preposto

credenciado, mediante carta de preposição, que deverá ser apresentada em audiência, ou em até

48 (quarenta e oito horas) após a sua realização, em caso de pedido de dilação de prazo,

devidamente justificado.

CAPITULO X

DO ATENDIMENTO PÚBLICO

Artigo 51 - É obrigatório que, no atendimento público de balcão nas Secretarias das

Varas e demais repartições do Judiciário, existam preferência aos idosos, às gestantes e aos

portadores de necessidades especiais.

Artigo 52 - No atendimento público de balcão o princípio da urbanidade será sempre

respeitado, devendo as partes e seus procuradores ser atendidos levando-se em conta a ordem de

chegada, dentro de prazo razoável, que nunca deverá exceder a 30 (trinta) minutos, ressalvadas

as preferências legais.

Parágrafo único - A ordem de chegada observará a inscrição em livro ou meio eletrônico

próprio.

CAPITULO XI

DAS CONSULTAS ELETRÔNICAS

Artigo 53 - Assegura-se a qualquer interessado a consulta visual dos processos

eletrônicos que não estiverem protegidos de segredo de justiça, em terminais específicos dentro

dos fóruns e do Tribunal de Justiça, com possibilidade de verificação das folhas dos autos,

como se estivessem materializados.

§ 1º - A consulta compreenderá informação dos últimos andamentos lançados em

relação ao processo e respectivas datas, acrescida da menção na tela de que se trata de processo

eletrônico.

§ 2º - Poderá a parte ou seu procurador obter cópia não controlada do processo

eletrônico, mediante pagamento da taxa respectiva, que será impressa com a indicação da

palavra “cópia” em todas as folhas cuja impressão for solicitada.

§ 3º - O Juiz Corregedor permanente, desde que previamente autorizado pela

Corregedoria, havendo concordância das partes, poderá autorizar a digitalização de processos já

materializados.

CAPÍTULO XII

DA CONSERVAÇÃO DOS PROCESSOS FÍSICOS E ELETRÔNICOS

Artigo 54 - Os autos dos processos físicos em andamento serão mantidos nas secretarias

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das varas, organizados de forma a permitir localização imediata dos autos para vista das partes

ou seus procuradores.

Parágrafo único - Quando conclusos os autos no gabinete ou na sala do juiz, a vista às

partes ou aos seus procuradores dependerá de prévia autorização do juiz.

Artigo 55 - Os arquivos eletrônicos de processos não resguardados pelo segredo de

justiça serão disponibilizados na internet por meio de extratos e conteúdo integral, permitindo

consultas por quem quer que seja, de forma livre, sem necessidade de senhas ou pagamento de

custas ou tarifas.

Artigo 56 - Os processos findos ou suspensos por prazo superior a um ano serão

remetidos a um arquivo central, onde permanecerão, independentemente de desarquivamentos

intercorrentes, por 20 (vinte) anos, e poderão ser digitalizados e os autos, após comunicação por

edital com, no mínimo 120 dias de prazo, incinerados.

Parágrafo único - O desarquivamento será determinado de ofício pelo Juiz ou mediante

requerimento dos advogados das partes, por petição ao responsável pelo arquivo, a qual poderá

ser protocolizada diretamente ou por meio de fax ou mensagem eletrônica, sendo os autos

devolvidos à Secretaria da Vara de origem.

CAPÍTULO XIII

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E FINAIS

Artigo 57 - A presente lei, no que couber e for necessário, será regulamentada no prazo

de 180 dias.

Artigo 58 - As despesas decorrentes da aplicação desta lei correrão à conta das dotações

próprias consignadas no orçamento vigente, ficando o Poder Executivo autorizado a abrir, para

o corrente exercício, se necessário, créditos suplementares.

Artigo 59 - Será assegurada a utilização de dependência apropriada dentro dos foros e

tribunais para que os advogados possam manter contato pessoal e reservado com os réus presos

Artigo 60 - Esta lei entra em vigor 180 (cento e oitenta) dias após a data de sua

publicação.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

20/11 – Além da CF: STF julga conflito de lei local com lei federal

O Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou julgamento de questão de ordem levantada há 20 anos e concluiu que cabe sim à corte suprema julgar conflito de lei local com lei federal. A decisão foi tomada nessa quinta-feira (19/11) em Agravo de Instrumento, cuja questão de ordem havia sido levantada em 1989.

Na época, o relator, ministro Moreira Alves, hoje aposentado, manifestou-se pela incompetência do STF e determinou a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O ministro Celso de Mello pediu vista e apresentou seu voto um ano depois. Aí foi a vez de Sepúlveda Pertence pedir vista. A questão ficou parada no seu gabinete até ele se aposentar e Menezes Direito assumir a cadeira. Direito morreu em setembro e não teve tempo para levar o processo para julgamento. A missão coube ao ministro Dias Toffoli, que assumiu o lugar de Direito.

Em seu voto, Toffoli ressaltou que a alínea “d” do inciso III do artigo 102 da Constituição Federal, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional 45/04, a chamada Reforma do Judiciário, deixou claro que cabe ao Supremo Tribunal Federal “julgar validade de lei local contestada em face de lei federal”. Ao votar na questão de ordem, o ministro Dias Toffoli fez um histórico das alterações constitucionais quanto ao tema, explicando que, quando o agravo chegou ao STF, ainda vigorava a Emenda Constitucional 1/69, que dispunha, no seu artigo 119, inciso III, que competia ao STF julgar válida a lei ou ato do governo local contestado em face da Constituição ou de lei federal.

A Constituição de 1988, posterior à apresentação do Recurso Extraordinário negado na origem, atribuiu competência ao STJ para julgar válida lei ou ato do governo local contestado em face da lei federal (artigo 105, inciso III, alínea “b”). Em 2004, a Emenda Constitucional 45 separou esse dispositivo em relação às competências enquanto lei e ato de governo: manteve no STJ o julgamento de conflito entre ato de governo local e lei federal e devolveu ao STF a competência para julgar o conflito de lei local em face de lei federal.

“E como eu soluciono esta questão de ordem? Tanto na época da interposição do Recurso Extraordinário como hoje, momento em que se julga a questão de ordem, a competência está posta ao Supremo Tribunal Federal. Então eu discordo do relator, que havia proposto a remessa dos autos ao STJ, após declarar a incompetência do Supremo Tribunal Federal para julgar o processo”, concluiu. Com a conclusão do julgamento da questão de ordem dando ela competência do STF para julgar o processo, os autos irão ao gabinete do ministro Joaquim Barbosa, sucessor do então relator, ministro Moreira Alves, para que a decisão de mérito seja analisada.

AI 132.755

Fonte: (Consultor Jurídico Site: http://www.conjur.com.br/2009-nov-20/stf-quem-julgar-conflito-lei-local-lei-federal - Acesso em: 20/11/09).

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

critica nova Lei do Mandado de Segurança

Presidente da República sancionou a lei sem nenhum dos vetos propostos pela entidade em ofício encaminhado no dia 22 de julho

O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, criticou a nova Lei do Mandado de Segurança, sancionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sem nenhum dos vetos propostos pela entidade. Para ele, a nova lei, quando exige caução para concessão de liminar, cria segregação: "só quem tem dinheiro para caucionar terá seus direitos protegidos".

Em 22 de julho, a OAB-SP enviou ofício ao presidente Lula, pedindo veto parcial ao Projeto de Lei 125/06. O documento foi assinado por Márcia Regina Machado Melaré, que estava no exercício da presidência da OAB-SP, e por Walter Cardoso Henrique, presidente da Comissão Especial de Assuntos Tributários.

O ofício pedia ao presidente que vetasse o parágrafo 2º do artigo 7º, o artigo 8º e os parágrafos 1º e 2º do artigo 15. Segundo estudo da Comissão, esses dispositivos restringem o acesso à Justiça e o direito à própria tutela jurisdicional do mandado de segurança, podendo levar a práticas arbitrárias.

A OAB-SP criticava também a impossibilidade de impetração do mandado de segurança para a compensação tributária. "O assunto já é objeto de exaustivas limitações legais (Código Tributário Nacional, artigo 170-A, e Lei nº 9.430/96), inviabilizando a redação proposta sem o exame de abusos e ilegalidade pontuais sobre aspectos que, não tocando o cerne da compensação, muitas vezes tornam impraticáveis o exercício de direito assegurado, até previamente, pelo Poder Judiciário e pelo Poder Executivo", ressaltava o ofício.

No entender da OAB-SP, o veto integral ao artigo 8º era absolutamente necessário porque seu conteúdo reprime o acesso dos cidadãos ao mandado de segurança. Quanto ao veto parcial do artigo 15, a OAB-SP entende serem suficientes as demais limitações contidas no texto aprovado pelo Congresso para assegurar os interesses públicos envolvidos, no tocante ao tema da chamada suspensão de segurança.

Segundo Márcia Melaré, a OAB-SP endossa também as críticas do Conselho Federal à nova Lei do Mandado de Segurança, especialmente a que condena a proibição de condenação de honorários advocatícios em mandado de segurança, "pois dessa forma todos os custos com a defesa recairão exclusivamente sobre o cidadão".

Fonte: Jornal do Advogado

São Paulo aprova 13,16% no Exame de Ordem Unificado

A Comissão de Estágio e Exame de Ordem divulgou, em 21 de julho, os resultados do primeiro Exame de Ordem Unificado do qual participou o Estado de São Paulo: foram aprovados 2.535 bacharéis, o equivalente a 13,61% do total de 18.925 candidatos inscritos.

A primeira fase do Exame, de caráter objetivo, foi realizada no dia 17 de maio, e reprovou 86% dos bacharéis inscritos, selecionando apenas 2.935 para a segunda fase, composta da redação de uma peça jurídica e cinco questões dissertativas.

O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, voltou a atribuir os resultados à baixa qualidade do ensino jurídico, lembrando que no concurso para a magistratura paulista, que pretendia preencher 183 vagas, apenas 76 candidatos foram aprovados. "A baixa qualidade do ensino jurídico reflete-se em todos os concursos para as carreiras jurídicas. E o Exame de Ordem, que busca aferir se os bacharéis possuem condições mínimas para atuarem como advogados, não é diferente", afirma.

Fonte: Jornal do Advogado

terça-feira, 15 de setembro de 2009

A Causa da Unidade dos EUA

Fonte: Grandes Advogados, Grandes Julgamentos - Pedro Paulo Filho - Depto. Editorial OAB-SP
Daniel Webster

Daniel Webster nasceu em 1782, em Salisbury, um ano antes da vitória da Guerra da Independência dos Estados Unidos. Dotado de prodigiosa nemória, desde jovem dedicou-se ao estudo das letras clássicas, com especial atenção aos oradores da antiguidade. Lia e decorava Cícero, completamente embevecido, para depois declamá-lo. Ainda moço, começou a revelar-se um prodigioso orador.

Formou-se em Direito, iniciando uma triunfal carreira nos Tribunais norte-americanos. Rapidamente obteve a celebridade e passou a ser citado como exemplo de eloqüência judiciária. Logo o povo norte-americano levou-o para o Congresso, e daí como secretário de Estado dos presidentes Harrison e Tyler. A sua atividade política, de 1813 a 1852, foi febricitante, agitada o tormentosa.

Quando, em 1830, cresceu a luta separatista entre Os Estados do Sul e do Norte, falando-se abertamente na possibilidade de separação, esse grande advogado, respondendo ao senador Hayne, da Carolina do Sul, afirmou:

"Quando meus olhos, pela última vez, contemplaram o sol no céu, não quero vê-lo a brilhar sobre os estraçalhados e desonrados fragmentos de uma gloriosa União, sobre uma terra torturada de lutas civis, encharcada do sangue de irmãos. Quero, sim, que meu último olhar se enleve no signo de uma República honrada no universo inteiro, mais ainda do que a temos agora, com suas armas e troféus rebrilhando do lustre original, em uma só listra do pavilhão arrancada ou poluída, trazendo como divisa não uma miserável pergunta `Que vale tudo isso?´; não estas palavras do horror e de loucura - `Liberdade primeiro, União em seguida´, mas estes caracteres de uma luz, espalhados por toda a sua superfície, refulgindo sobre as suas vastas dobras, enquanto flutuam nos mares e nas terras, sob os céus, a todos os ventos, este outro sentimento querido a todo o coração americano - Liberdade e União, agora e sempre, unidas e inseparáveis."

Daniel Webster sofreu muito com os constantes atritos havidos entre o Norte e o Sul, o que se agravou em 1850, com o recrudescimento da campanha abolicionista. Manifestaram-se a favor da abolição da escravatura, como a maioria dos políticos norte-americanos, mas, ao constatar que essa luta poderia transformar-se em luta fratricida, recuou, para evitar um mal nacional maior.

Advogado da unidade política dos Estados Unidos, em 1850, Webster pronunciou memorável discurso no Parlamento de seu país: "Senhor presidente: nos tempos agitados que vão correndo, nota-se um estado de constantes criminações e recriminações entre o Norte e o Sul. Há listas de agravos apresentados por ambos, e estes agravos, reais ou supostos, exasperam a opinião pública, alienam a amizade de uma parte do país pela outra, diminuem o sentimento de união fraternal, o amor da pátria e a estima mútua".

Mais além, depois de abordar a questão abolicionista, Webster proclamou:

"Também tem havido, Sr. Presidente, queixas contra a violência da imprensa. A imprensa violenta!

A imprensa é violenta em toda a parte. Há violentas increpações do Norte contra o Sul e há censuras de não menor tom do Sul contra o Norte. Os radicais, de ambos os lados deste país, são violentos; tomam os discursos altos e impetuosos por eloqüência e por senso comum. Julgam que aquele que fala mais alto é o que melhor raciocina. Mas isto é o que se deve esperar quando a imprensa é livre como aqui - e espero que sempre o seja, porque, com todo o seu desbragamento, com todo o seu mal, a liberdade absoluta e completa da imprensa é essencial à conservação de um governo, baseado numa Constituição livre onde quer que ela exista, haverá artigos tolos e violentos na imprensa, como há, penaliza-me dizê-lo, discursos tolos e discursos violentos em ambas as casas do Congresso. Para falar a verdade, devo dizer, Sr. Presidente, que a língua vernácula deste país tem sido muito viciada, rebaixada e corrompida nos nossos debates parlamentais. E se fosse possível que os nossos debates no Congresso viciassem os princípios do povo como lhe tem depravado o gosto, eu gritaria: Deus, salvai a República!"

Toda a assistência assiste emocionada ao discurso do Webster, que, com sua voz sonora, vai aos poucos arrebatando o auditório. Disse: "Senhor Presidente, envergonho-me de prosseguir nestas observações. Não gosto delas - tenho por elas profundo desgosto. Gostava mais do ouvir falar em catástrofes, em guerras, em fome, em epidemias do que falar em secessão.

Dividirmo-nos! Dividir este grande governo!

Desmembrar este grande país! Espantar a Europa com um ato de loucura como ela não vê em nenhum povo, há dois séculos! Não, senhor presidente, não!

Não há de haver secessão - e ninguém fala a sério quando fala em secessão..."

Webster continua falando, ardorosamente, no Parlamento norte-americano: "E agora, Sr. Presidente, em vez de falar da possibilidade ou utilidade da secessão, em vez de ficar nessas cavernas de escuridão, em vez de andar, às apalpadelas, com essas idéias cheias de tudo que é nefasto e horrível, saiamos para a luz do dia; gozemos o fresco ar da liberdade e da união; acarinhemos aquelas esperanças que nos pertencem, dediquemo-nos àqueles grandes assuntos que são dignos de nossa consideração e do nosso trabalho; levantemos os nossos pensamentos até a altura e a importância dos deveres que impedem que nossas concepções sejam tão grandes como a terra por que trabalhamos, as nossas aspirações tão altas como o seu destino certo; não sejamos pigmeus quando a ocasião precisa do gigantes.

Nunca pesaram sobre uma geração responsabilidades maiores do que as que pesam sobre nós, para a manutenção desta Constituição e para a harmonia e a paz de todos que hão de viver sob ela.

Façamos da nossa geração um dos mais fortes e mais brilhantes elos da cadeia dourada que está destinada, creio-o bem, a prender o povo de todos estes Estados a esta Constituição pelos séculos vindouros.

Nosso governo é um grande governo popular e constitucional, mantido pela legislação, pela lei, pela magistratura e defendido por todos os afetos do povo.

Nenhum trono monárquico comprime estes Estados, nenhum poder despótico os comprime; vivem com um governo popular na forma, representativo no caráter, fundado sobre a igualdade, destinado a subsistir eternamente.

Em toda a sua história tem sido beneficente; nunca espezinhou a liberdade de ninguém, nunca esmagou nenhum Estado.

A sua respiração diária é a liberdade e o patriotismo; as suas veias moças estão cheias de iniciativas, de coragem e de um honesto amor da glória e do renome. Recebeu um grande aumento do território.

Grande antes, o país tornou-se ainda maior com os acontecimentos recentes. Esta República estende-se, agora, numa grande largura por todo o continente.

Os dois grandes mares do universo banham-lhe ambas as costas. Realizemos, pois, numa enorme escalada a linda descrição da orla ornamentada do escudo de Aquiles."

Os abolicionistas norte-americanos ficaram sentidos com Daniel Webster por sua luta centrar-se unicamente na unidade nacional, abandonando a causa da abolição da escravatura. Chamaram-no traidor. O grande poeta Walt Whitman, fervoroso abolicionista, chegou a escrever: "A palavra liberdade na boca do Sr. Webster soa como a palavra amor na boca de uma cortesã!"

Webster, porém, manteve-se altivo e inatacável, pois, entre a permanência da escravidão e a quebra da unidade dos Estados Unidos, optara pela última solução, que considerou a causa maior do povo americano.

0 americano John Macy considerou o estilo oratório de Webster demasiado eloqüênte e beirando o ridículo, ao passo que Hyde o considerou demosteniano, mais do que ciceroniano, mais simples que enfeitado. Forte e sublime, apelava mais para a compreensão do que para o coração.

Hélio Sodré afirmou que ambos estavam certos, porque Webster lera Cícero e Demóstenes e por isto se encontram nele reflexos dos oradores grego e romano.

Marcava-o, porém, a variabilidade de seu discurso, que ora era simples, enérgico, sintético, ora florido, pomposo e esparramado. Era, portanto, um orador com possibilidades extraordinárias.

A sua glória permanece intocável, sendo um dos nomes veneráveis nos EUA. Um grande advogado da unidade política norte - americana!

A Bíblia e a Constituição

Fonte: Grandes Advogados, Grandes Julgamentos - Pedro Paulo Filho - Depto. Editorial OAB-SP
Pedro Aleixo

"Qual o maior Pedro Aleixo?", indagou Paulo Pinheiro Chagas, recepcionando o ilustre homem público e advogado no seu ingresso na Academia de Letras de Minas Gerais.
"Há que ver em vós, antes de tudo, o advogado.
Advogado de lei, fizeste um nome de jurista, que ainda repercute no foro e, professor de Direito, dignificaste o magistério.
Advogado dos pobres, entre outras benemerências, construístes a Fundação São José, para a qual já destinastes todos os vossos bens, de que vossa família terá apenas o usufruto.
Advogado do povo, defendestes os seus direitos na imprensa, nos comícios, no parlamento. Advogado da liberdade, sempre vos batestes por ela, em todas as suas formas e por sua sobrevivência em todos os lugares.
Mas o causídico que há em vós, senhor Pedro Aleixo, não tem como armas apenas a virtude quase monarcal, a sabedoria jurídica, a cultura humanística, o amor das boas letras. O primeiro motivo de vosso poder é a palavra do orador. Na cátedra, na Tribuna do Júri ou do Parlamento, nos palanques populares, a vossa facúndia acendeu luzes, traçou normas, indicou rumos.
Porque vós não sois somente um cultor da arte de dizer bem, com o vosso estilo castiço e vosso gosto ático, mas um poeta da eloquência. De resto, como que a robustecer ainda mais a figura do advogado, que é a vossa segunda natureza, há um fato definidor. Sabe-se que tendes dois livros de cabeceira: a Bíblia e a Constituição da República.
E desta verificação outra vez aparece o advogado, de um lado submisso à lei de Deus e do outro à lei dos homens."
Na reunião do Conselho de Segurança Nacional, a 13 de dezembro de 1968, quando foi lida a minuta do Ato Institucional nº 5, o prof. Gama e Silva, então ministro da Justiça, comentou incisivo e categórico:
"Este Ato institucionalizará a Revolução."
O Advogado Pedro Aleixo, presente na reunião, na qualidade de vice-presidente da República, contestou, imediatamente:
"Discordo do ministro Gama e Silva. A Revolução está institucionalizada pela Constituição de 1967, uma Constituição forte, contendo todos os remédios para os males políticos.
O Ato lido agora vai institucionalizar a ditadura. Pelo que ouvi, acaba com o Legislativo, colocando-o em recesso pelo livre-arbítrio do Poder Executivo.
E torna o Judiciário apêndice do Palácio do Planalto, ao suspender a inamovibilidade e a vitaliciedade de seus membros. O sentido discricionário e de exceção nesse documento é um perigo permanente para as instituições."
Mas o Ministro Gama e Silva insistiu:
"Mas não será instrumento discricionário ou perigoso, pois estará em mãos honradas como as do presidente Costa e Silva!"
Pedro Aleixo retrucou sobranceiramente:
"Mas nem ao honrado presidente é dado o dom da ubiqüidade e da onisciência.
O sistema de cascata determinará os poderes de exceção aplicados pelo mais reles esbirro policial. Na suspensão do "habeas corpus", por exemplo, que, segundo a minuta lide, não prevalecerá para os crimes políticos ou contra a ordem econômica, quem estabelecerá a tipicidade de cada fato? Quem dirá se tal ou qual crime tem implicações políticas ou se relaciona com a ordem econômica? Muitas vezes, matéria importante estará em mãos de um recalcado ou de um despreparado."
Ao contrário da edição do AI-5, Pedro Aleixo defendia a implantação do estado de sítio.
Aberta a sucessão presidencial, com o impedimento do presidente Costa e Silva, o argumento para afastá-lo da investidura no cargo de Presidente da República foi justamente este: o de ter sido contrário ao Ato Institucional nº 5.

A Árvora Má

Fonte: Grandes Advogados, Grandes Julgamentos - Pedro Paulo Filho - Depto. Editorial OAB-SP
Abraham Lincoln

Logo depois de formado em Direito - contou o historiador William Chase -, Lincoln foi convidado a defender um réu de homicídio, que matara a tiros de revólver um ladrão que tentara arrombar a porta de sua casa.
O autor do crime era um homem pacato, honesto, religioso e exemplar chefe de família. Conhecendo-o, Lincoln aceitou o encargo de defender o sitiante trabalhador. O réu explicou ao seu advogado que o ladrão portava em uma das mãos um revólver e um afiadíssimo punhal em outra, e que, se conseguisse entrar em seu lar, haveria cenas dantescas e sanguinolentas, pois todos os seus familiares estavam dormindo.
Cinco testemunhas depuseram a favor do acusado, mas três outras afirmaram que, como o ladrão não conseguira abrir a porta, não se justificava o homicídio e deixavam claro que haviam sido industriadas pelos familiares da vítima. No dia do julgamento, procedeu-se à colheita de todos os depoimentos.
Abraham Lincoln houvera escrito que o homicídio ocorrera às 23h30, mas as testemunhas favoráveis à vítima disseram que o evento ocorrera às 22h30, ocasião em que ouviram os tiros e presenciaram o delito.
O escrivão que a tudo anotava, percebendo que havia uma hora de diferença, tentou falar algo, mas Lincoln, interferindo, disse-lhe:
"O senhor, como bom funcionário que é, naturalmente com bons ouvidos, deverá apenas escrever o que estão dizendo as testemunhas".
O escrivão da Corte respondeu:
"Queira desculpar-me, Dr. Lincoln."
Dada a palavra ao defensor, assim disse Abraham Lincoln, que portava uma Bíblia nas mãos:
"Ilustres senhores presidente e demais membros desta Egrégia Corte dos Estados Unidos da América do Norte.
Antes de falar como defensor de uma causa justa, branca e pura, como os cabelos de minha mãe que está no céu, peço-vos a devida venia, por ser um homem profundamente religioso, para ler dois capítulos do Livro Sagrado, que trago às mãos: "Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus"."
Manuseando rapidamente o Evangelho, tornou a ler: "Toda a árvore que não produzir bons frutos, seja cortada e jogada ao fogo".
Colocou a Bíblia sobre a cadeira, olhou para todos os jurados e disse: "Pois bem, senhor presidente e demais membros desta Egrégia Corte.
Se o meu cliente aqui sentado é também um bem-aventurado e limpo de coração, porque é homem honrado, exemplar chefe de família, bom pai, bom filho e bom esposo, e que "ganha o pão de cada dia com o suor do seu rosto", pressentindo que uma árvore má, que pendia às portas de sua casa, cujos galhos, que eram as armas transformadas num revólver e num punhal, como uma verdadeira tempestade, arrancando-lhe as portas do seu lar sagrado, sem dúvida alguma iria deixá-lo manchado de sangue, visto que, se estivesse ele dormindo, assim como todos os seus familiares e vizinhos, as cinco testemunhas verdadeiras, e que viram pessoalmente o ocorrido, marcando em suas mentes a hora certa - 23h30 - e não as mentirosas - que são apenas três - compradas ao peso de dinheiro pelos parentes da árvore má, cujos frutos seriam o arrombamento e o roubo, bem como a mais triste das tragédias de vidas puras, e que, certamente, iria cobrir a casa de meu cliente com o manto negro de desgraça, como várias mortes de inocentes, felizmente, fora ela cortada e jogada ao fogo.
Como podeis ver, o meu cliente nada mais realizou, a bem da verdade, que a troca de seis árvores frutíferas, representadas pela esposa dele e os seus cinco filhos, por uma árvore má, carregada de veneno em seus galhos e que se apresentara às portas de um lar sagrado, como um terrível furacão, como aquele que sepultou as cidades de Pompéia e Herculano, onde campeavam o roubo, o vício, as ofensas à honra e à dignidade alheias.
Assim, por estes motivos expostos, deixarei a cargo dos ilustres membros da Corte, se desejam condenar ou absolver o meu cliente, comprovadamente, um nobre de caráter e inocente."
Terminado o discurso, uma calorosa salva de palmas se ouviu na Corte e pessoas gritavam: "É inocente! É inocente!" Os 19 membros da Corte se retiraram, permanecendo na sala secreta por oito minutos, e voltaram com o veredicto: "Absolvido".
As três testemunhas falsas aproximaram-se do advogado de defesa, dizendo-lhe: "Dr. Lincoln, como Jesus perdoara a todos que o crucificaram, queira também nos dar o seu perdão."
Lincoln respondeu: "Como disse São Francisco de Assis, é perdoando que seremos perdoados. Os senhores estão perdoados."

A Advocacia Criminal

Fonte: Grandes Advogados, Grandes Julgamentos - Pedro Paulo Filho - Depto. Editorial OAB-SP
Louis Nizer

O famoso advogado norte-ainericano Louis Nizer contou em suas memórias a fascinante atração que sofreu ao conhecer, pela primeira vez, as instalações da Suprema Corte de seu país. Vale a pena recordar:

"Os postais do foro de Londres foram construídos de tal modo que, para entrar, se é forçado a baixar a cabeça.

Esse recurso arquitetural em louvor ao respeito devido à histórica profissão constitui interessante simbolismo.

Meu próprio simbolismo, quanto à reverência ante a lei, prende-se a uma recordação da infância, a uma situação em que, ao invés de encurvar-me, punha-me na ponta dos pés. Enquanto trabalhava como entregador de mercadorias para uma sapataria, costumava entrar no prédio da Suprema Corte dos Estados Unidos, que ficava próximo.

Sonhava em ser advogado, quando crescesse.

O chamariz dos grandes advogados que atuavam em casos importantes era tão irresistível quanto o anúncio de que Enrico Caruso ia cantar na ópera.

O edifício da Suprema Corte era incomparavelmente fascinante a meus olhos.

Desde o momento em que neles penetrei, tudo - o chão frio de mármore colorido, os afrescos do teto que imortalizavam os fautores das leis, as pastas que pareciam esvoaçar abaixo e acima dos corredores, presas às mãos dos advogados, o cheiro característico dos livros velhos que emanava da biblioteca no andar térreo, as placas de madeira com letras douradas, nos ângulos das paredes, indicando `Audiência de Julgamento, Parte I´-, tudo era magicamente belo e excitante.

Li, muitas vezes, descrições do encantamento de crianças que vão ao circo pela primeira vez.

Acredito que suas sensações não se comparam ao arrebatamento com que eu caminhava no interior do Tribunal.

No entanto, o mais maravilhoso de tudo eram as portas que se abriam para a sala dos julgamentos.

Eram portais místicos. Os batentes eram altos, forrados de couro verde-escuro, com puxadores de cobre - pouco utilizados, pois havia em torno deles a mancha escura deixada pelo contacto das mãos, ao empurrarem as portas.

Cada um dos batentes tinha painéis de vidro, ovalados, pelos quais se podia observar o interior.

Ficavam alto demais para mim, tinha que esticar-me na ponta dos pés para lançar um olhar para dentro, tal como uma Criança que olha por uma brecha de muro para apreciar uma partida de beisebol.

O que eu via deixava-me de respiração suspensa, embora, muitas vezes, não tivesse grande movimento.

Via o escriturário marcando papéis, documentos do processo, ao passo que os demais ficavam sentados ou andavam de um lado para outro.

No entanto, cada marca de carimbo que ele colocava num papel assumia a meus olhos um significado altamente dramático.

Contemplava o advogado cuja fama me lavava até lá. Quase sempre, parecia não estar fazendo nada, apenas sentado em sua cadeira, à vontade, observando.

Para mim, no entanto, sua imobilidade era apenas física, deveria estar mergulhando em seus planos de ação. Outras vezes, uma testemunha estava sendo interrogada. Eu não ouvia nenhum som e a pantomima inflamava a minha imaginação.

Observava os jurados, acompanhava em seus rosto a reação ao depoimento prestado pela testemunha, via o advogado erguer-se, de repente, talvez, para fazer uma objeção, a boca do juiz movimentava-se, o advogado tornava a sentar-se.

Às vezes, minha visita coincidia com um arrazoado. Via o advogado a andar de um lado para outro diante dos jurados, seu queixo a mover-se furiosamente, gesticular, empunhando papéis, via-o respirar fundo, ao império da emoção.

Quase podia adivinhar algumas palavras que dizia. Quando os jurados se inclinavam para a frente e redobravam de atenção, sabia que o advogado estava desenvolvendo uma argumentação persuasiva.

Quando os via sentados, à vontade, mostrando desinteresse, compreendia que o advogado estava em situação difícil.

Mesmo quando ousei, em algumas raras ocasiões, entrar no salão, tinha que guiar-me ainda pelas impressões visuais, pois as palavras pareciam pairar, incompreensivelmente, no espaço.

Quase sempre ficava de fora, na ponta dos pés, de pescoço esticado para alcançar a vidraça.

Aquilo era o símbolo de uma prece, como se eu estivesse de joelhos. Algum dia, estava certo disso, eu abriria aquelas portas a entraria naquele salão como advogado, participando da mais alta função - a administração da Justiça.

Realizei meu sonho. Abri as portas de centenas de Tribunais, em vários Estados - mas a excitação jamais diminuiu. O desafio é sempre novo.

A luta é sempre intensa. A surpresa está sempre presente. A satisfação de atender a um nobre chamado é única e brilhante."

Encantado e seduzido pala advocacia criminal, Louis Nizer escreveu que um julgamento é mais do que a ruidosa excitação de um combate, em que as palavras são armas e a inteligência é principal instrumento de defesa e ataque.

"É a busca da verdade. Diógenes, com sua lanterna, seria um bom substituto para o símbolo cego da Justiça.

A tarefa do advogado consiste na reconstrução dos acontecimentos passados, aos quais acrescenta fatos persuasivos a favor de seu cliente.

Age como o arqueologista, que precisa pesquisar a exumar velhas provas da verdade.

Como pode saber onde procurar e o que procurar? Este é o supremo teste preparatório - como admitirá qualquer advogado criminal -, pois a preparação adequada de um caso a ser levado a julgamento é a chave para o sucesso. `O homem estúpido deverá fazer como se fosse inteligente, a inteligente como se fosse talentoso a o talentoso como se fosse genial."´

Explica que, por mais experiente que seja o advogado, os momentos que antecedem a sessão de julgamento são sempre nervosos e angustiosos e, invariavelmente, ele se sente como se fosse sempre a primeira vez.

"Na manhã do dia em que começa o julgamento, todos os indícios são de insuportável trepidação.

As mãos ficam pegajosas, o suor acumula-se por sobre as sobrancelhas, as faces ora se mostram pálidas, ora coradas, os olhos avermelham-se, as vozes tomam-se agudas, há um freqüente bocejar, os lábios ficam secos e as visitas ao banheiro são freqüentes.

É o momento em que o advogado, embora sofra dos mesmos sintomas, embora também seu pulso se acelere, deve incutir confiança ao exército hesitante ao seu redor.

Nessas ocasiões, cumprimento os clientes e as testemunhas efusiva, cordial e jovialmente, incutindo-lhes tranqüilidade e confiança.

Devem contagiar-se com minha serenidade.

Agarram-se a isso a daí retiram forças.

Em todos os instantes, o advogado deve ser a central de energia, distribuindo-a por todos.

Quando consegue criar em torno dele uma atmosfera de segurança, é como se proporcionasse oxigênio, que alivia a respiração atormentada.

Em conseqüência, também o Júri é envolvido e influenciado pelo ar confiante do advogado a o efeito psicológico por isto causado sobre as convicções é incalculável."

Louis Nizer deu valiosos conselhos aos advogados, notadamente aos mais novos: um dos erros mais freqüentes nos interrogatórios constitui a tentativa de "espremer" a testemunha, em busca de uma afirmação valiosa para o cliente.

"É preciso que haja bom discernimento e que a inquiridor avalie bem se a vantagem supera a risco.

Já vi, muitas vezes, uma testemunha desferir um golpe arrasador, que poderia ser previsto, caso o inquiridor não se apegasse estreitamente à tentativa de obter uma afirmação de valor secundário, desprezando as conseqüências."

Outro conselho: "Preparo as anotações para o interrogatório escrevendo as perguntas do lado esquerdo da página. Do lado direito, transcrevo as respostas exatas que a testemunha deu às mesmas perguntas. Se existirem diversas versões, registro cada uma delas, com referência à página, para quando fizer a inquirição".

Dentro do sistema processual norte-americano, a inquirição de testemunhas constitui uma verdadeira arte e chave do sucesso e, por isto, Louis Nizer explica que "há um tempo psicológico para o advogado aventurar-se com uma testemunha.

Uma pergunta dirigida no momento em que a resistência da testemunha é vigorosa pode ser ineficiente. A mesma pergunta lançada no momento em que a testemunha estiver confusa e com o moral baixo poderá provocar uma confissão. O inquiridor deve ter sensibilidade para sentir o estado de espírito da testemunha a variar a técnica do interrogatório, de acordo com as circunstâncias."

Quentin Reynolds foi um de seus clientes mais famosos. Certa feita, toda a nação americana foi sacudida por um extenso artigo do jornalista Westbrook Pegler, publicado em uma cadeia de 160 jornais, que representavam 12 milhões de exemplares, atacando com virulência Quentin Reynolds.

Pegler descrevia Reynolds como se fosse um animal de pele sarnosa "que fora cuidadosamente cardada e pendurada à porta do estábulo, para que todo mundo visse o bulbo de suas listas amarelas", tinha um ventre protuberante, no qual havia algo mais além das vísceras", fora um correspondente "ausente da guerra", e como tal "fizera, a bordo de um navio de guerra, a cobertura jornalística do reide contra Dieppe, de um vantajoso e seguro posto de observação, e enfim, acusava-o de covarde.

Louis Nizer apresentou queixa de difamação e injúria contra Westbrook Pegler e as duas Corporações Hearst, que publicavam a Journal American, de Nova York, e que distribuíram a coluna de Pegler a vários jornais dos Estados Unidos.

No dia do julgamento, Nizer iniciou a sua oração com as palavras protocolares: "Meritíssimo juiz, senhoras e senhores.

"Eu estava de pé diante do Júri para responder a Mr. Henry (advogado dos réus) com meu arrazoado.

Sentia-me bem disposto, alerta, embora não tivesse me deitado nem dormindo um só minuto na noite precedente. Não houvera tempo para o cansaço.

É comum a estratégia utilizada pela defesa para reduzir pelo ridículo a importância das acusações do queixoso, cobrindo-as de observações sarcásticas.

Mr. Henry executara tal jogo brilhantemente.

Tal estratégia, porém, está sujeita a pesados contra-ataques. Quando é possível demonstrar que os fatos foram desprezados pela defesa, que brincou levianamente com a verdade, sua frívola atitude pode ser ressaltada como ofensiva.

É por isso que os arrazoados espirituosos, que desprezam as provas, têm vida precária.

Logo que são submetidos à luz de uma análise reveladora, caem por terra.

O Júri sempre reage contra a leviandade, quando a verdade aponta para a tragédia. Empenhei-me, no início, em esvaziar o balão de ridículo que a defesa tinha inflado. Minha técnica consistiu em criar uma imagem, facilmente compreensível, com a qual fustigaria a defesa. Perguntei:

`Que deve fazer um advogado de defesa, num caso como este? Em geral, faz o que fez habilmente Mr. Henry: tenta, desde a primeiro instante, obscurecer o caso, não discutir o mérito, não pesquisar os fatos nem a verdade e abscurecer os mais possível o quadro geral´.

Dirigindo-me aos jurados, disse-lhes:

`Gostaria de lembrar-lhes algo sobre o octópode (polvo).

Quando um octópode é atacado pelo inimigo, emite um jato de líquido negro, a água fica obscurecida e, na confusão, o octópode foge.

Neste caso, desde o primeiro momento... até o hábil arrazoado que ouvimos, os acusados emitiram um líquido negro para obscurecer a verdade.´

O feio retrato do octópode tonou-se mais vívido a cada exemplo que eu citava e, algum tempo depois, bastava-me lembrar a paralelo, num gesto ondeado de mão e dizer fluido negro para que a alusão se completasse."

Na peroração, Louis Nizer proclamou: "Há nestes autos a marca de uma impressão digital, prova de uma tentativa de assassino econômico, e esta impressão digital é de Pegler. Tentou destruir todas as fontes de rendimentos de Mr. Reynolds, e isto constitui uma prova de má fé, que brilha claramente nas trevas.

Tenho que me limitar a Reynolds, mas os senhores têm o direito de verificar que isto é o sintoma de uma espécie de doença... a explosão de uma doença moral de que padece a nova sociedade e da qual Pegler é um dos principais agentes.

A expressão `peglerizar´ tonou-se comum, entrou para os dicionários. É uma expressão de perversidade, uma palavra má, bem conhecida de costa a costa.

Senhoras e senhores... um assassino e um difamador não diferem entre si. Ambos são criminosos, embora usem armas diferentes. Quando um se utiliza da pena e da máquina de impressão, para destruir o que um homem possui de mais precioso, sua reputação, abre oportunidade para que um dos nossos Júris, em sua sabedoria de julgar, dê uma lição a esse bomem e a outros que o imitam, condenando-o à indenização punitiva."

"Quando me sentei, Ginny, a esposa de meu cliente, e outros estavam chorando mansamente. Tínhamos feito o possível para vingar Reynolds.

Nossa tarefa estava cumprida."

Fora mais uma espetacular vitória do advogado Louis Nizer, pois os réus foram condenados à indenização punitiva.

O Tribunal de Nuremberg

Fonte: Grandes Advogados, Grandes Julgamentos - Pedro Paulo Filho - Depto. Editorial OAB-SP
Os Advogados de Defesa Alemães

Foi uma experiência extremamente dolorosa para os advogados alemães a defesa de seus clientes, acusados perante o Tribunal de Nuremberg de graves crimes de guerra. Advogar perante o Tribunal dos vencedores em favor dos vencidos era tarefa hercúlea de heróis, pois a Alemanha vencida na Segunda Guerra Mundial estava submetida aos aliados, que instituíram o Tribunal de Nuremberg para julgar os vencidos de guerra.

Foram réus no Tribunal de Nuremberg Hermann Goering, Rudolf Hess, Joachim Von Ribbentrop, Robert Ley, Wilhelm Keitel, Emst Kaltenbrunner, Alfred Rosemberg, Hans Frank, Wilhelm Frick, Julius Streicher, Wilhelm Funk, Hjalmar Sclacht, Gustav Krupp, Karl Donitz, Erich Raeder, Baldur Von Schirach, Frita Sauckel, Alfred Jodl, Martins Borman, Franz Von Papen, Arthur Seyss-Inquart, Albert Speer, Constantin Von Neurath e Hans Fritz-che.

Otto Stahmer foi advogado de Hermann Goering, Hans Von Marx, de Julius Streicher, Fritz Sauter, de Joachim Von Ribbentrop e Gunther Von Rohscheidt, de Rudolf Hess. Hess chegou a dizer: "Sinto-me perfeitamente bem sem advogado".

O promotor norte-americano Robert Jackson iniciou a acusação contra os réus em 1945, juntando uma avalancha de documentos altamente comprometedores contra os acusados. Jackson iniciou a acusação com uma violenta denúncia da tirania nazista, proclamando que a civilização esperava que a ação jurídica dos juizes do Tribunal colocasse as forças do direito internacional, seus preceitos, suas proibições e, acima de tudo, suas sanções ao lado da paz, para que homens e mulheres de boa vontade, em todos os países, possam ter "a liberdade de viver, sem depender da permissão de ninguém, sob a proteção da lei".

Depois da entrega das acusações aos prisioneiros, a reação de cada um foi diversa. Goering declarou: "O vencedor será sempre o juiz e o derrotado o acusado"; para Streicher 0 julgamento fora um triunfo do sionismo internacional. Frick afirmou que toda a acusação se baseava na suposição de uma conspiração fictícia, Speer foi complacente: "O julgamento é necessário. Há uma responsabilidade comum por crimes tão horríveis, mesmo num sistema autoritário".

O mesmo disse Frank: "Considero o julgamento como um Tribunal determinado por Deus, destinado a examinar e a pôr fim à terrível era de sofrimento sob o domínio de Hitler". Jodl lamentou a mistura de acusações justificadas com propaganda política. Keitel disse: "Para um soldado, ordens são ordens"; e Funk: "Se sou considerado culpado por erro ou ignorância, então minha culpa é uma tragédia, não um crime".

Bradley Smith conta que "nenhuma defesa seria capaz de anular o feito da acometida inicial da Promotoria norte-americana, mas, nesse particular, a posição dos advogados alemães era ainda pior que qualquer outra, e tudo o que podiam fazer não passava de uma resistência simbólica.

As autoridades aliadas não haviam tentado descobrir advogados de talento excepcional para os réus: o que se reuniu foi um grupo responsável de advogados aprovados pela Corte. Um réu podia escolher um desses advogados ou solicitar aprovação da Corte para um nome que ele próprio lembrasse.

Entretanto, sofriam os advogados, como todos os alemães. 0 choque da derrota, da destruição e da tristeza que os cercavam.

Selecionados, em geral, por terem sentimentos antinazistas ou se terem comportado com frieza em relação ao regime de Hitler, os advogados de defesa alemães, em sua maioria, responsabilizaram os réus, pela desgraça própria e pela desgraça do país."

Dispunham de pouca autoridade e não tinham recursos para colher provas em meio aos escombros de seu país. Também não lhes fora dado tempo razoável para preparar as defesas e, vez por outra, se surpreendiam com inovações processuais criadas pela Corte de Nuremberg. A defesa foi sumamente prejudicada pela prevalência da prova documental à testemunhal, visto que as provas documentais carreadas pêlos aliados eram extraordinárias e vultosas.

Logo no início do julgamento, os advogados de defesa aprovaram moção segundo a qual o Tribunal de Nuremberg vulnerava o antigo princípio de que não deve ser tratado como crime, e por ele ninguém deve ser punido, o cometimento de qualquer ato que não tenha sido declarado criminoso por lei já existente quando de sua realização "nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege", em sua forma latina convencional. A defesa tentou também tirar partido de outro princípio muito conhecido: "tu quoque" (você é outro), considerando que, dentre os crimes denunciados, havia também alguns cometidos pelos aliados.

Questão tão importante para os advogados era a defesa das ordens superiores, pois, na maioria dos casos, os acusados poderiam escudar-se no argumento de que suas ordens e decretos obedeciam as diretrizes de Hitler, que era o chefe do governo.

Iniciadas as provas orais, os advogados alemães sentiram grandes dificuldades no que tange à assimilação das técnicas do contraditório.

"Estavam acostumados a um sistema fundado em maior entendimento entre a defesa, a promotoria e os juízes; em Nuremberg, a defesa e a promotoria eram inimigas mortais e os advogados alemães não logravam fugir à impressão de que os outros os tinham na conta de auxiliadores de bandidos.

Alguns promotores encaravam com hostilidade não apenas os réus, mas os alemães em geral."

Aos advogados de defesa era sempre lembrado que eram cidadãos de segunda classe. Esse sentimento, por outro lado, deve ter encorajado os defensores alemães e a se identificarem mais de perto com seus clientes.

Não resta dúvida de que nos primeiros dias de funcionamento do Tribunal de Nuremberg, na Alemanha, na atmosfera que abateu sobre os advogados alemães era demasiadamente hostil. A defesa iniciou os seus trabalhos em 8 de março de 1945, com o processo do Marechal do Reich, Hermamm Goering, cujo advogado era Otto Stahmer.

O clima de animosidade já havia melhorado e os advogados ji desconfiavam menos da Corte que nos primeiros meses e, embora reclamassem de algumas decisões, davam sinais de que consideravam o Tribunal imparcial.

"Três dias antes de Stahmer tomar a palavra, o ânimo de todos os advogados de defesa fora revigorado, pois o Tribunal repreendera as autoridades de ocupação por permitirem ataques da imprensa aos advogados.

Além disso, o Tribunal elogiara os serviços prestados pelos advogados em condições que os juízes entendiam ser extremamente difíceis e notificara, oficialmente, o Comando Militar Aliado na Alemanha de que os advogados de defesa se encontravam sob a proteção do Tribunal e que a Corte não toleraria quaisquer outros ataques públicos ou pela imprensa que lhes fossem dirigidos."

Na verdade, a linha de defesa dos advogados alemães resumiu-se nas 400 sessões públicas do Tribunal de Nuremberg, em adotar uma posição que protegesse o homem comum da Alemanha e defendesse a reputação do país. Frustados por não poderem lastrear-se em argumentos mais jurídicos, lutaram por expungir da Alemanha a mácula de culpa coletiva, no que despenderam, com louvor e admiração pública, um esforço sobre-humano.

Lorde Kilmuir escreveu em suas memórias que dois dos advogados, o mais velho e o mais jovem, dr. Roudolf Dix, que defendeu Schacht, e Otto Kranzbuhler, que defendeu Donitz, eram os melhores que se poderia encontrar em qualquer Tribunal, enquanto os outros estavam à altura da elevada tradição da profissão, em circunstâncias que lhes devem ter sido extremamente difíceis.

As sentenças impostas pelo Tribunal Militar Internacional de Nuremberg foram as seguintes: Goering (morte), Hess (prisão perpétua), Ribbentrop (morte), Keitel (morte), Kaltenbruner (morte), Rosemberg (morte), Frank (morte), Frick (morte), Streicher (morte), Funk (prisão perpétua), Schirach (20 anos de prisão), Schacht (absolvição), Donitz (10 anos de prisão), Raeder (prisão perpétua), Sanckel (morte), Jodl (morte), Borman (morte), Papen (absolvição), Seyss-Ingurart (morte), Speer (20 anos de prisão), Neurath (15 anos de prisão) e Fritzche (absolvição).

Pelos ataques ferinos de que foram alvos, como cidadãos de segunda classe, pela pressão que sofreram, pelas artimanhas processuais criadas pelo Tribunal, pela discriminação injusta decorrente da nacionalidade alemã e pela gravidade dos crimes imputados aos seus clientes, como causadores da II Guerra Mundial, os advogados alemães encarnaram, com fidelidade e realismo, a coragem, o destemor e a fibra que se exige de um advogado verdadeiro.

sábado, 1 de agosto de 2009

Projeto pune pai ou mãe separados que incitarem o filho ao ódio

Viva o Brasil das Leis!!
Achei interessante postar essa materia divulgada pela Camara dos Deputados em Brasilia!


"Tramita na Câmara o Projeto de Lei 5197/09, do deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT), que pune com a perda do poder familiar sobre o filho o pai ou a mãe que caluniar, difamar ou injuriar o ex-companheiro ou ex-cônjuge com a intenção de desmoralizá-lo perante o filho.

Com a proposta, o deputado espera combater a Síndrome da Alienação Parental, que ocorre quando o pai ou a mãe que possui a guarda do filho denigre a imagem do outro genitor para distanciá-lo da criança.

"A situação chega a um ponto em que o filho passa a rejeitar o pai. Com a dificuldade de relacionamento, as visitas vão se rareando até a perda total do contato. Nesses casos, a criança ou o adolescente aceita como verdadeiro tudo que lhe é informado. Tal comportamento deve ser combatido, pois prejudica a criança e o genitor que não detém a guarda do filho", diz o deputado.

O projeto altera o Código Civil (Lei 10.406/02) na parte que se refere ao poder familiar. Atualmente, a perda do poder familiar ocorre no caso de morte dos pais ou dos filhos, após a maioridade, em caso de adoção, por exemplo. Além disso, o juiz pode suspender o exercício desse poder se o pai ou a mãe castigar imoderadamente o filho, abandoná-lo, praticar atos contrários à moral e aos bons costumes ou abusar de sua autoridade.

Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania".

Íntegra da proposta:
- PL-5197/2009

Fonte: Agência Câmara

domingo, 19 de julho de 2009

Contribuição do brilhante aluno do 5 ano do curso de Direito Gerson Mungo.

Pena. Regime. Progressão. Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP. 14/07/2009 Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP.

Habeas Corpus nº 990.08.174696-4

São Paulo Impetrante: Adriana Mayer dos Santos Paciente: Maria Magdalena Smith
PENA - Regime - Progressão - Indeferimento do pedido pelo fato de a sentenciada ser estrangeira em situação irregular no país - Descabimento - Preenchimento do requisito objetivo (cumprimento de mais de um sexto da pena no regime fechado) e subjetivo (bom comportamento carcerário) pela condenada, que é titular dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal - Alegado risco de fuga que decorre de mera presunção, não sendo baseado em dados concretos do processo - Inaplicabilidade, no caso, da vedação ao exercício de atividade remunerada pelo estrangeiro (imposta pelo artigo 98 da Lei n. 6.815/80), uma vez que a atividade laborativa a ser desenvolvida no regime semi-aberto é parte integrante da execução individualizada da pena e visa ao cumprimento de seus objetivos ressocializadores, não sendo abrangida pela limitação imposta no Estatuto do Estrangeiro - Inexistência de qualquer distinção (na Constituição Federal e na Lei de Execução Penal) quanto à nacionalidade dos sentenciados, bem como de impedmento legal ao deferimento da progressão de regime com fundamento no local de nascimento do condenado, sendo certo que eventual interpretação restritiva dos direitos dos sentenciados estrangeiros criaria uma hipótese de regime integral fechado não prevista em qualquer diploma legal - Ordem concedida para progredir a paciente ao regime semi-aberto.

ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 990.08.174696-4, da Comarca de São Paulo, em que é impetrante ADRIANA MAYER DOS SANTOS e Paciente MARIA MAGDALENA SMITH. ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "CONCEDERAM A ORDEM PARA PROGREDIR MARIA MAGDALENA SMITH AO REGIME SEMI-ABERTO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores PERICLES PIZA (Presidente sem voto), MARCO NAHUM E FIGUEIREDO GONÇALVES. São Paulo, 02 de fevereiro de 2009. MÁRCIO BARTOLI RELATOR VOTO Nº 18.334

1. A defensora pública Adriana Mayer dos Santos impetra a presente ordem de habeas corpus em favor de Maria Magdalena Smith, sob a alegação de que a paciente se encontra submetida a constrangimento ilegal consistente na sua manutenção em regime fechado, pois teve indeferido pedido de progressão de sistema prisional, pelo fato de ser estrangeira em situação irregular no país. Alega que a motivação da decisão não encontra amparo legal e afronta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa e da isonomia, pois constituiria discriminação em razão de ser estrangeira. Pede a reforma da sentença para ser deferida a sua progressão ao regime semi-aberto (cf.razões de fls. 20/24). O pedido liminar foi negado pelo despacho de fl. 25.
Juntou-se aos autos o ofício de informações prestadas pela autoridade impetrada (fl. 28), acompanhadas de cópias (fls. 29/38). Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça as fls. 40/6.

2. Segundo consta do ofício de informações, Maria Magdalena Smith foi condenada à pena de sete anos, três meses e vinte e dois dias de reclusão, pela prática do delito previsto no artigo 33, caput, c.c. artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06. O término do cumprimento da pena está previsto para o dia 16 de maio de 2014. Em 11 de novembro de 2008, foi indeferido seu pedido de progressão de regime. A autoridade apontada como coatora decidiu que por ser a sentenciada estrangeira é "incabível a concessão tanto do livramento condicional quanto da progressão ao regime semi-aberto ou aberto para os estrangeiros em situação administrativamente irregular" (fl. 32), e que, embora inexista decreto de expulsão contra a paciente, há grande risco de fuga (fls.32/4). É caso de concessão da ordem.

3. Inicialmente, registra-se que a execução da pena, além de uma atividade administrativa atribuída aos órgãos, penitenciários do Estado-Administração, tem tratamento constitucional, conclusão que se extrai da interpretação do caput e dos incisos XXXIX, XLVI, XLVII, XLVIII e XLIX, do artigo 5º, da Constituição Federal, estando submetida, diretamente, aos princípios da igualdade, da legalidade, da individualização e da humanidade das penas.

4. Embora, em princípio, a situação jurídica da paciente não esteja abrangida pelo caput do artigo 5º da Constituição Federal, que se refere taxativamente apenas "aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País", é posição consolidada na doutrina e na jurisprudência que se aplicam os direitos e garantias fundamentais aos brasileiros e estrangeiros que estejam no território nacional, referindo-se a questão mais à soberania do que a limitação da titularidade desses direitos, que são universais por natureza. Nesse sentido a afirmativa do Min. Celso de Mello[Constituição Federal anotada 2ª ed. São Paulo Saraiva, 1986, p 424 Igualmente é a posição de Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco: "A declaração dos direitos fundamentais da Constituição abrange diversos direitos que radicam diretamente no princípio da dignidade do homem - princípio que o art 1º, III, da Constituição, Federal toma como estruturante do Estado democrático de direito o respeito devido à dignidade de todos os homens não se excepciona pelo fator meramente circunstancial da nacionalidade" (Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva, 2007, p 262-263)]: "A garantia de inviolabilidade dos direitos fundamentais, salvo as exceções de ordem constitucional, se estende também aos estrangeiros não residentes ou domiciliados no Brasil. O caráter universal dos direitos do homem não se compatibiliza com estatutos que os ignorem. A expressão residente no Brasil deve ser interpretada no sentido de que a Carta Federal só pode assegurar a validade e o gozo dos direitos fundamentais dentro do território brasileiro". André Ramos Tavares(Curso de direito constitucional. 4ª ed rev. e atual São Paulo Saraiva, 2006, p 444) chega a apontar a existência de quatro diferentes correntes que fundamentam a inclusão do estrangeiro não-residente como titular de direitos fundamentais: "A primeira corrente é denominada 'argumento do óbvio', e simplesmente ignora o sentido gramatical mínimo das palavras do texto em análise, aduzindo que é evidente que todos estariam protegidos, inclusive o estrangeiro não-residente. A segunda corrente é denominada 'argumento dos direito naturais', segundo a qual não poderia o legislador constituinte pretender restringir certos direitos, que são inerentes ao Homem. A terceira corrente seria a do 'argumento dos direitos decorrentes', que encontra no parágrafo segundo do artigo 5º uma solução nos tratados fundamentais (boa parte do que se encontra arrolado no artigo 5º da Constituição do Brasil). Essa corrente, após a Reforma do Judiciário, promovida pela EC 45/2004, teve sua importância reforçada, pois esses direitos passaram a contar com 'estatura' constitucional, o que não lhes era reconhecido anteriormente (por força da jurisprudência do STF).
A quarta corrente, do 'argumento da dignidade humana', sustenta que desse fundamento vários direitos 'tópicos' podem ser derivados, especialmente porque a dignidade é, na Constituição do Brasil, um dos fundamentos do Estado, constando do artigo 1º, III, e, nesse sentido, seu alcance é amplo e alberga os estrangeiro não residentes que estejam sob a sua jurisdição. Essa corrente deve ser, atualmente, somada à anterior, para sustentar a tutela constitucional do estrangeiro não-residente". É que, conforme o preâmbulo da Convenção Americana sobre Direito Humanos, "os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana".

5. Considerando-se, então, que a paciente é titular dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal, deve ser afastado o óbice à progressão de regime, decorrente unicamente de sua condição de estrangeira, verificando-se, concretamente, se ela tem direito de ser transferida ao regime semi-aberto. Em primeiro lugar, registra-se que estão presentes os requisitos objetivo - cumprimento de mais de um sexto da pena no regime fechado, cf. fls. boletim informativo de fls. 10/2- e subjetivo, bom comportamento carcerário (fl. 9). Em segundo lugar, verifica-se que o argumento referente ao risco de fuga é insuficiente para o indeferimento do pedido, pois não é baseado em dados concretos do processo, mas decorrente de mera presunção, que não pode sustentar o indeferimento da remoção. Assim já se manifestou o Supremo Tribunal Federal(STF, 2ª T , HC 74 051, rel. Min. Marco Aurélio, j. 18 06 1996, DJ 20 09 1996, trecho do acórdão) : "O problema concernente à possível evasão do território nacional é simplesmente de polícia, cabendo ao Estado precatar-se a respeito. Enquanto ciência, em Direito o meio justifica o fim, mas não este aquele, sendo extravagante, frente à fundamentação lançada, manter-se o Paciente sob a custódia do Estado (...)". No mesmo sentido, decisão deste Tribunal: "Não se pode negar a progressão de regime prisional a condenado estrangeiro sob fundamentação de que, em regime mais favorável, empreenderá eventual fuga. O artigo 5º da CF garante a igualdade perante a lei sem distinção de qualquer natureza, sejam brasileiros ou estrangeiros residentes no País(TJSP, Agr. em Execução, rel. Des. Ângelo Gallucci, RT 657/281 in Alberto Silva Franco e Rui Stoco(coord) Código de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial 2ª ed .rev.atual e ampl. São Paulo RT, 2004, p 365).". De outro lado, a vedação ao exercício de atividade remunerada pelo estrangeiro imposta pelo artigo 98 da Lei nº 6.815/90 também é inaplicável no caso, tendo em vista a peculiaridade da situação da agravante no país, que decorre de sua submissão à função punitiva estatal. A atividade laborativa a ser desenvolvida pela condenada no regime semi-aberto é parte integrante da execução individualizada de sua pena, tem finalidade educativa e produtiva, e visa o cumprimento de seus objetivos ressocializadores (cf. artigo 38 da LEP), não sendo abrangida pela limitação imposta no Estatuto do Estrangeiro. Isso porque ao princípio constitucional da individualização da pena deve ser dada a máxima concretização possível para que esta -a sanção criminal - atinja suas finalidades. Na lição de Luis Roberto Barroso(Interpretação e aplicação da Constituição fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora São Paulo Saraiva, 2004, p 374): "o intérprete constitucional deve ter compromisso com a efetividade da Constituição: entre interpretações alternativas e plausíveis, deverá prestigiar aquela que permita a atuação da vontade constitucional, evitando, no limite do possível, soluções que se refugiem no argumento da não-auto-aplicabilidade da norma ou na ocorrência de omissão do legislador".

6. Conclui-se, portanto, que não há impedimento legal ao deferimento da progressão de regime para estrangeiros, "primeiro, porque a Lei de Execução Penal não faz diferença entre a nacionalidade dos sentenciados para conferir os direitos que elenca. Depois, porque se houvesse esta odiosa distinção entre condenados brasileiros e estrangeiros, no mínimo, haveria ofensa ao princípio da isonomia jurídica, que assegura a todos um tratamento igual perante a lei (artigo 5º, caput, da Constituição Federal)"(Alberto Zacharias Toron O condenado estrangeiro e a progressão do regime prisional Boletim IBCCRIM São Paulo, v 7, n 81, p. 11-12, ago 1999).

7. Importa observar, ainda, que a impossibilidade de deferimento de progressão de regime ao estrangeiro é entendimento que se firmou na doutrina e jurisprudência nacional com base em um argumento simplista: ao Brasil não interessaria a ressocialização do estrangeiro, que, tão logo cumprida a pena imposta, seria expulso do país. A tomar essa premissa como base, seria autorizada hipótese em que a pena cumpriria uma única finalidade: a retribuição pelo mal praticado, o que é incompatível com o nosso sistema penal, pautado no princípio da dignidade humana. Com efeito, como ensina a doutrina, dar a pena uma função unicamente retributiva é atribuir-lhe um caráter absoluto, "desligado de quaisquer fins, extrai-se que na teoria retributiva a aplicação da pena tem a exclusiva função de compensar, contrabalançar a culpa. Dessa forma, e sendo inegável que na teoria retributiva há verdadeira confusão entre direito e moral, ela caracteriza violência à dignidade humana, na medida em que prioriza a satisfação da generalidade em detrimento do indivíduo. Conclui-se com Roxin que a diferença entre retribuição e prevenção 'está em que a retribuição serve apenas à idéia de Justiça e abstrai de todos os fins sociais, enquanto que as doutrinas preventivas, pelo contrário, prosseguem exclusivamente fins sociais, quer se vejam estes na integração social do agente, na intimação dele, na segurança da sociedade perante ele ou na actuação sobre a generalidade das pessoas'. Assim, só as teorias relativas são compatíveis com um Estado que tem por função preservar o indivíduo de intromissões em sua esfera íntima, em sua liberdade e personalidade, e garantir o convívio social pacífico. Mais detalhadamente, explica Ferrajoli que, em razão de ser o Estado de direito laico e liberal, o direito e o Estado 'não só não possuem nem encaram valores meramente enquanto tais, senão que tampouco devem ter fins morais desvinculados dos interesses das pessoas e menos ainda ser fins em si mesmos, justificando-se só pelo conteúdo de perseguir fins de utilidade concreta em favor dos cidadãos e principalmente de garantir seus direitos e sua segurança'"(Carmen Silvia de Moraes Barros. A individualização da Pena na Execução Penal São Paulo) Ademais, é sempre necessário ter em mente que o artigo 1º da Lei de Execução Penal preceitua que "a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado", não fazendo qualquer distinção entre nacionais e estrangeiros. Acrescenta, ainda, em seu artigo 3º que "ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela Lei. Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política". Independentemente, pois, de qualquer característica pessoal, de distinções baseadas no local de nascimento, o que se busca é a integração social do indivíduo apenado, afastando-se qualquer entendimento que permita o tratamento da pessoa como mero objeto da intervenção penal, sem quaisquer direitos ou garantias, impossibilitando qualquer medida de individualização da pena. Não é demais ressaltar, ainda, que é questionável a "falta de interesse" do país em promover a reintegração social do estrangeiro: em um mundo globalizado, em que a idéia de fronteiras não mais reflete a separação absoluta dos Estados nacionais, é um contra-senso afirmar que a única preocupação que concerne ao Poder Público é a satisfação exclusiva dos interesses e bem estar de seus nacionais, sob pena de retrocesso na evolução mundial tendente a integração política, econômica e social, que tem ganhado cada vez mais espaço desde o final do Século XX.

8. Destaque-se, finalmente, que permitir a interpretação restritiva aos direitos dos sentenciados estrangeiros seria criar uma hipótese de regime integral fechado não prevista em qualquer diploma legal. Se, antes, esse sistema era permitido pela Lei 8.072/90, verdade é que ele foi objeto de inúmeras críticas, havendo o reconhecimento de sua inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal e, por fim, sua revogação pela Lei 11.464/07. Portanto, não mais subsistindo essa forma de cumprimento de pena e, se nem a Constituição Federal e nem a Lei, no âmbito da execução penal, fazem qualquer distinção entre nacionais e estrangeiros, não é possível ao intérprete restringir a liberdade individual com base em entendimento, de todo, ultrapassado.

9. Assim se manifestou recentemente o Superior Tribunal de Justiça(STJ, 6ª T, HC 103 373, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26.08.2008, Dje 19.09.2008): "Processual penal. Execução penal. Habeas corpus. Estrangeiro não-residente no país. Progressão de regime prisional. Possibilidade. Tanto a execução penal do nacional quanto a do estrangeiro submetem-se aos cânones constitucionais da isonomia e da individualização da pena. Não se admite, após a nova ordem constitucional inaugurada em 1988, a remissão a julgados que se reportam a comandos com ela incompatíveis. A disciplina do trabalho no Estatuto do Estrangeiro não se presta a afastar o co-respectivo direito-dever do condenado no seio da execução penal. Ordem concedida". Igualmente: "Negar o livramento condicional ao condenado estrangeiro em situação irregular no país, pelo simples fato de estar impedido de exercer atividade remunerada no mercado formal, impõe condição discriminatória que veda a concessão do benefício apenas por sua própria condição pessoal. A lei penal não exige que o condenado estrangeiro tenha uma promessa efetiva de emprego, com carteira registrada, mas sim que tenha condição de exercer qualquer trabalho honesto e lícito para prover sua subsistência e de sua família, ainda que na informalidade da qual sobrevive expressiva parte da população brasileira"
(STJ, 5ª T , REsp 662 567, rel. Min. Laurita Vaz, j. 23 08 2005, DJ 26 09 2005, p 441)

10. Ante o exposto, concedem a ordem para progredir Maria Magdalena Smith ao regime semi-aberto.
Márcio Bartoli Relator